Dados preliminares do Ministério da Saúde indicam crescimento de 2,3% no uso de cigarros de 2023 para 2024; preço do cigarro mais barato e liberação de uso de aditivos favoreceu retomada nos números de fumantes
A quantidade de fumantes nas capitais brasileiras avançou mais de 2% em 2024, um retrocesso que pôe o país de volta a índices de uso de cigarros de 12 anos atrás, segundo dados preliminares do Ministério da Saúde apresentados hoje (28) pela pasta em evento de comemoração ao Dia Mundial Sem Tabaco, em Brasília.
De acordo com os números, a prevalência de fumantes nas capitais no país chegou a 11,6% – um crescimento de 2,3% comparado a 2023, quando os mesmos índices estavam na casa dos 9,3%. O aumento coloca as capitais brasileiras de volta a patamares próximos aos de 2013, quando o percentual de tabagistas era levemente menor, em torno de 11,3%.
“Isso é fruto de uma inação: foram oito anos sem reajuste nos preços dos cigarros. E uma proibição a aditivos em fumígenos aprovada em 2012 até hoje não está em vigor”, avalia Mônica Andreis, diretora da ONG antitabaco ACT Promoção da Saúde. “É bem preocupante e mostra a importância do país voltar a ter campanhas de comunicação contínuas e retomar as ações de controle do tabaco.”
Mesmo com um aumento de preços nos cigarros no ano passado, fumar hoje está mais barato do que era em 2012 considerada a variação da inflação e do PIB per capita. Além disso, desde 2013 o país também não conseguiu implementar medidas que proíbem o uso de aditivos, como adoçantes, saborizantes e anestésicos, em produtos de tabaco. De lá para cá, a indústria do fumo tem garantido na Justiça que a regra seja letra morta.
Prevalência de fumantes nas capitais brasileiras atingiu 11,6%, um retrocesso que retoma níveis de 2013.
Desde 2006, o Vigitel monitora anualmente a incidência de doenças crônicas no Brasil usando as populações das capitais como parâmetro. No mesmo ano, o país também ratificou a Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco (CQCT), tratado internacional de saúde em que se comprometeu a combater o tabagismo e a interferência da indústria do cigarro em políticas públicas. Este é o maior crescimento nos índices de tabagismo das capitais brasileiras desde então.
“Não é à toa que a indústria do tabaco faz propaganda direto. O fato de usar propaganda, dar visibilidade daquilo que interessa a eles, divulgar suas marcas, vai cultivando um certo hábito às pessoas”, disse no evento o ministro da Saúde, Alexandre Padilha. “Se a gente não usar todos os instrumentos que nós temos para divulgar o tempo todo os impactos negativos que esses produtos têm nas famílias, na saúde, na economia, a gente não ganha essa batalha.”
Consumo de vapes segue estável, mas uso teve avanço preocupante entre as mulheres
Os números preliminares do Vigitel também ressaltaram que, apesar do avanço no uso de cigarros convencionais, o consumo de cigarros eletrônicos seguiu estável, na faixa dos 2,6% da população das capitais. Ainda assim, é o maior patamar da série histórica da pesquisa. Entre 2020 e 2023, o índice havia variado entre 2,1 e 2,5%.
Uso de vapes manteve indíces estáveis, mas apresentou preocupante avanço de uso entre as mulheres.
A maior preocupação vem do avanço na popularidade de cigarros eletrônicos entre as mulheres: de 2023 para 2024, o consumo saltou de 1,4% para 2,6%, um uso maior que entre os homens (2.5%).
O mesmo salto também foi observado no uso de cigarros convencionais, com o público feminino respondendo por um avanço relativo de cerca de 36% no tabagismo no mesmo período – entre homens, o aumento no índice ficou por volta de 18%.
“É urgente que a gente volte a intervir mais duramente sobre as ações que a gente sabe que dão certo, principalmente se comunicando com os jovens, que estão aí voltando a fumar”, alertou Letícia Cardoso, do Departamento de Análise Epidemiológica e Vigilância de Doenças Não Transmissíveis do Ministério da Saúde, durante a apresentação dos dados.
O Dia Mundial Sem Tabaco é uma data organizada anualmente pela Organização Mundial da Saúde (OMS). O tema deste ano é “Desmascarando a indústria do tabaco: expondo as táticas das empresas para deixar os produtos de tabaco e nicotina mais atrativos”.
R$ 5 de prejuízo ao país para cada R$ 1 de lucro para a indústria do cigarro
O Ministério da Saúde também estimou que para cada R$ 1 de lucro obtido pela indústria do tabaco, o país gasta cerca de R$ 2,30 para tratar doenças causados pelo fumo. Os prejuízos chegam à casa dos R$ 5,10 se forem considerados também os custos indiretos do tabagismo, como morte precoce e adoecimento.
Os dados são de um estudo publicado pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca) e divulgado no evento. A pesquisa considerou doenças relacionadas ao tabagismo, como acidentes vasculares cerebrais (AVCs) e cânceres de pulmão.
Neste caso, os prejuízos causados pelo fumo hoje estão ainda maiores se comparados às mesmas estimativas em 2013, ainda que a prevalência esteja em índices parecidos.
De acordo com o estudo, na época, para cada R$ 1 de lucro da indústria do cigarro, o Brasil tinha quase o dobro de gasto direto em tratamento de doenças ligadas ao fumo – menos que os R$ 2,30 estimados atualmente.